sexta-feira, 16 de outubro de 2009

O retorno a São Paulo

Depois de 10 meses direto em Belém e interior do Pará realizando a pesquisa de campo, chega a hora de retornar a São Paulo. Sair do umbigo revivido do convívio com a familia, do reencontro com os lugares da memória, os amigos de infância e do calor úmido tão conhecidos, para voltar a selva do concreto sempre desconhecida para um estrangeiro e para seus fluxos vertiginosos me faz lembrar o flâneur baudelairiano às avessas.

Me dá um misto de vazio e ansiedade pelo que virá. No fundo sei que todo meu corpo sente a mudança e tenta se readaptar. Sinto meu coração se acelerar, a respiração mais ofegante, a mão mais ágil e trêmula. Em 24 h, o corpo todo parece acelerar depois da hibernação amazônica. Tudo o que vi e vivi lá de repente assume outro contexto aqui. E sei que esse distanciamento é necessário para eu poder escrever com a máxima independência possivel.

Fui me despedindo aos poucos, e corooei esse tempo com a participação no Cirio, que é uma experiência que vai muito além da religião. Foi como tomar um choque de energia emanada daquelas 2 milhões de pessoas. Agora é voltar para a terra de quase 20 milhões de pessoas e tentar reencontrar meu lugar aqui. Devo voltar ainda a Belém e talvez a Parauapebas, de passagem, pois ainda há dados a recolher.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

A viagem de volta pra Belém

Passei duas semanas em Parauapebas, intercaladas por uma semana em Belém. No dia 18 de setembro percebi que seria melhor deixar meu carro em Parauapebas e voltar pra Belém de avião pois o aluguel de um carro por uma semana sairia muito caro. No sábado, dia 19/9, fomos de carro, Ana, Isaias e eu até Marabá. De lá, peguei um vôo da TAM para Belém. Durante a semana, mesmo estranhando um pouco o fato de estar sem carro, pude voltar a sede da Vale para aprofundar alguns dads que havia observado no campo e retomar meu diálogo com o Antonio Venâncio. Também pude aprofundar a pesquisa na SUDAM. Depois desses encontros, retornei a Parauapebas, desta vez por meio de um vôo da TRIP com destino a Carajás no dia 25/9. Foi uma experiência ver o lago imenso da barragem de Tucurí (escala do vôo) de cima, e perceber a imensidão de sua devastação, com suas ilhas semi encobertas. Depois a chegada a Carajás é também impactante pela visão da Flona e do núcleo urbano de cima. Passei uma semana em Peba realizando as últimas entrevstas da pesquisa e os comentários sobre ela estarão no próximo post. Vou pular então para a viagem de volta. Como não havia com quem dividir a direção, voltei sozinha dirigindo. Saí de Parauapebas na quinta, dia 1/10, e passei por Curionópolis, Eldorado, Vila Betel, Vila Sororó, chegando a Marabá por volta das 17h, onde dormi e fiquei feliz pois a net da claro voltou a funcionar já que em Peba não pega. No dia 2/10, sexta, saí de Marabá às 7h30 da manhã, e passei por Nova Ipixuna, Jacundá (pior trecho da estrada), Goianésia, Vila Aparecida, Vila Genésio, Víla Águas Claras, Tailândia, Vila Nova Betel, Vila do Açu, Palmares, VIla Olho d'Água, Betânia e as entradas das cidades de Moju, Abaetetuba e Barcarena, até chegar a Belém por volta das 15h00 da tarde e 540 km rodados. Estava com o corpo doído mas graças a Deus, tudo ocorreu bem na viagem, e o meu carro mais uma vez se mostrou um ótimo companheiro de viagem ao som de muita MPB e das rádios locais.

Ilhas da Represa de Tucuruí vistas de cima


Núcleo Urbano rodeado pela FLONA - Floresta Nacional de Carajás

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Os desafios da pesquisa de campo

O maior desafio que tenho enfrentado na pesquisa de campo não são a distância de Parauapebas em relação a Belém, as más condições das estradas, o desconforto do desconhecido, ou mesmo a dificuldade em conseguir contactar as pessoas e agendar as entrevistas. Diria que a maior dificuldade reside em encontrar o viés correto, o posicionamento que não crie expectativas equivocadas junto aos entrevistados com relação a pesquisa. Como não acredito na neutralidade nem na total isenção do pesquisador, e ao já ter conversado com inúmeras pessoas, de diferentes origens sociais, representações institucionais e posicionamentos políticos, tenho me movido por uma linha tênue e extremamente difícil de opiniões muito divergentes a respeito da mesma situação. Acho q vim mexer em casa de marimbondo e a chance de sair machucada disso é grande. Por nunca ter me filiado a partidos políticos ou grupos institucionalizados dentro ou fora da universidade, hoje me questiono se o preço a pagar por tanta independência não será alto demais. Apenas uma coisa vai ficando clara para mim. Sobre o tema de minha pesquisa, não há uma única e pura verdade. Há os fatos, mas mesmo esses não deixam de ser uma construção signica, uma representação social - daí certa desconfiança minha com a estatística. Percebo que o caminho da razoabilidade, que entendo como a racionalidade com bom senso, pode ser a minha única chance de realizar uma pesquisa não dogmática ou ideologizada. Como espero terminar o campo até quinta no máxima, espero ter essas questões mais claras no próximo post.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Nova campanha da Vale é uma resposta a Lula

Justamente quando a mídia divulga uma certa "insatisfação" do presidente Lula com a postura da Vale durante a crise, por ter reduzido investimentos e ter demitido funcionários, não apenas o presidente da Vale, Roger Agnelli, foi a Brasilia conversar com o presidente, como lançou a campanha "Nuvens" em horário nobre da TV aberta. Em tom ufanista com a trilha da marchinha de Paulo Soledad "Estão voltando as flores", o comercial mostra os próximos investimentos da companhia e os empregos a serem gerados, uma espécie de resposta pública ao presidente, o que não deixa também de ser uma demonstração de força da cia.

Porto e Ferrovia


Siderúrgicas:


Navios:


Investimentos:

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A chegada do trem da Vale




Entre ontem e hoje, exatamente a meia noite, onde eu estava? Esperando o trem da Vale chegar à estação ferroviária de Parauapebas. Eu e meus fiéis escudeiros, Cristiane e Isaias, estávamos com máquinas em punho para registrar esse momento. E a meia noite em ponto o bicho apontou com sua lanterna redonda e seu som característico - Peeeemmmm!

A estação está lotada de pessoas esperando. No estacionamento muitos carros e vans, inclusive um ônibus de grande porte da Transbrasiliana que levaria os seus passageiros para a Serra. Aos poucos os passageiros começam a descer, e e a fila vai adensando e vai crescendo, vai crescendo e é dificil não imaginar para onde toda aquela gente vai. Chegam muitas familias que não parecem migrantes mas pessoas que vieram visitar parentes, mas há tb muitos homens desacompanhados e esses sim, parecem ter vindo em busca de emprego e vida nova. Começa a gritaria dos meninos das vans, que berram seus destinos e tentam arrebanhar o máximo de clientes possiveis. E pelo número de vans que iam para Canaã, percebe-se que agora é para lá que se dirige esse fluxo migratório.

De onde essas pessoas vem? Para onde vão? Quem são elas? Quais história de vida por ali passaram? Foi uma experiência impactante ver esse desembarque e perceber que, em menos de 20 minutos, a estação já estava quase vazia, de volta ao silêncio da espera pelo próximo trem. Tudo muito rápido, como funcionam as coisas por aqui: o tempo de Parauapebas, em sua velocidade nervosa, me faz questionar se realmente vi e vivi aquilo ou foi apenas um sonho de uma noite estrelada.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A capacitação: ação sustentável sim.






Tudo aquilo que Hannah Arendt nos falava dos oimoi foi o que encontrei ontem em plena zona rural de Parauapebas. Na área da APA do Igarapé Gelado, que é administrado pelo Instituto Chico Mendes do IBAMA, habitam colonos que para cá vieram sobretudo na década de 80, a maioria vinda de Curionópolis para plantar. São agricultores que têm uma longa história de relação com a Vale, com quem já tiveram todo tipo de conflito. Hoje, a Vale construiu a Estação do Conhecimento, que é um projeto educacional voltado para o mundo rural, que inclui a criação de uma OSCIP e de uma Cooperativa de forma a que a comunidade se aproprie de técnicas agrícolas e pecuárias de ponta para aumentar a produção e organziar a comercialização do excedente, pois idéia é fazer uma agricultura familiar comercial. Mas nada disso é possivel sem a mobilização das pessoas, e nesses três dias está havendo essa atividade que é ministrada por dois coordenadores do instituto Fonte de São Paulo, para funcionários e diretores da Vale, técnicos e gestores da Estação, alguns consultores (da Diagonal de São Paulo) e para a comunidade da APA, muitos associados a APROAPA (a maioria dos participantes). Uma das atividades que mais me tocou foi quando o Tião, um dos coordenadores, incentivou todos ali presentes a contarem a história daquela comunidade, e foi incrível ver os mais antigos da Vale e da Comunidade contarem uma história de luta, sangue e coragem de apropriação do território - uma história que não está nos livros nem nos meios de comunicação. A luta por transformá-lo em APA - Área de Poteção Ambiental, e como um dia a Vale já foi truculenta na relação com a comunidade e como hoje ela mudou. Cheguei a registrar em foto esse momento que, pra mim, foi o mais significativo até aqui dessa relação. A Estação tem tudo para ser uma referência de projeto sustentável não porque tenha preocupação ambiental, produtiva ou social meramente, mas porque, sobretudo, coloca a comunidade no mesmo patamar decisório da Vale e da prefeitura. Porque fomenta um protagonismo que não é fácil de ser fomentado, mas a experiência e a inicativa que ali vi, de pessoas que um dia estavam de lados opostos, hoje podem participar da mesma conversa, discutindo e decidindo juntos, entre iguais, quais rumos o coletivo deve tomar, é sem dúvida, uma experiênca que eu diria inédita. Como afirma a Izabel, a APA não é a Atenas, e a Estação não é a Agora, mas nesses 3 dias, acho q ela chegou perto, e acho que a Hannah ia amar viver essa experiência que tive o privilégio de participar. E ainda teve o almoço delicioso na cabana, com todos os participantes.

Só para dar um pingo no i: ontem a governadora Ana Julia esteve aqui, inaugurando uma escola e algumas outras obras. Perguntei para alguns da comunidade o que eles falariam com a governadora, e eles (todos) disseram que ela deveria apoiar projetos como o da Estação porque ali sim eles viam o resultado concreto para a vida deles. Se há uma perspectiva que considera as ações de sustentabilidade mais uma forma de dominação simbólica das empresas, acho que a experiência da Estação é um caso mais complexo do que isso porque ali há um espaço democrático que visa ao protagonismo da comunidade.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

A semana em Parauapebas

A semana começou bem. Na segunda de manhã, entrevistei uma enfermeira da secretaria municipal de saúde que participou de uma capacitação do Vale Juventude. À tarde, fui buscar o Antonio Venâncio da Fundação Vale no aeroporto e de lá, fomos direto pra sede da Fundação no Núcleo de Carajás, onde encontramos o João Elias, e os dois me contaram boa parte da história dos projetos sociais da Vale. Conversamos durante algumas horas e foi muito bom tb porque pedi para acompanhar a capacitação que aconteceria no dia seguinte na APA do Gelado e eles deram ok. Na terça, fui encontrá-los na Estação do Conhecimento de lá. Saí cedo de casa pq sabia q a estrada seria uma pedreira, e foi. Errei o caminho e andei quase 40 km em estrada de terra a mais. Depois, me reencontrei e achei o lugar, depois de engolir muita terra e passar algum medo pois estava sozinha em estradas vicinais que não são exatamente seguras. Se eu reclamava do meu carro naquele dia da viagem, hj não tenho palavras. Ele tá uma poeira só: de preto, tá vermelho cor de barro. Hoje a saga continua...